Cuidados Com Seu Ursão



Inicialmente é necessário falar sobre a origem da raça e a função para a qual ela foi selecionada. Descendente dos antigos molossos, o Bulldog tem a sua gênese calcada em batalhas e lutas corporais. Eis a sua função primeira, lutar e defender! Em outras palavras, o Bulldog era uma máquina de guerra, com itens, como cabeça, corpo, mordedura, tronco, pele, temperamento e resistência à dor, cuidadosamente selecionados durante centenas de anos para que fosse, primeiramente, um soldado e, posteriormente, como a raça acabou sendo consagrada, um gladiador nos esportes de época – em especial as lutas contra touros, ursos e até mesmo em rinhas de cães.  Muito embora a figura do Bulldog atual apresente um distanciamento físico do seu antepassado de arena, muitos dos traços primitivos estão fortemente presentes na versão moderna da raça e formam a sua essência, ou seja, são características pela quais a raça é identificada. É o caso da cabeça braquicefálica, da mandíbula prognata, do topline (linha de dorso com posterior mais alto) e do formato do corpo (mais pesado e forte na frente em comparação com o posterior).  Do ponto de vista comportamental, podemos dizer que há também uma grande diferença entre aquele cão de luta do passado e o Bulldog atual, hoje um cão essencialmente de companhia e perfeitamente adaptado à vida moderna e aos grandes centros urbanos. Aliás, cabe o registro de que a raça só conseguiu chegar aos dias atuais, e ainda gozando de grande popularidade, graças ao trabalho de obstinados criadores que, mesmo com a proibição de tais esportes violentos (1835), mantiveram seus Bulldogs e, por meio de cruzamentos seletivos, conseguiram tirar o viés agressivo da raça. É claro que nos dias de hoje, com todo o tratamento e regalias que um Bulldog moderno faz jus como membro da família, fica muito mais fácil ser aquele cão bonachão e pacato que conhecemos do que o ancestral raivoso e sempre pronto para atacar. Não é difícil de imaginar o tratamento dispensado às “estrelas” do Bull baitings rings no Século XVIII... Sobre a importância do “esporte” na época e a herança deixada por ele, envolvendo principalmente a briga contra touros em suas respectivas arenas, reproduzimos trecho da matéria extraída do jornal Londrino “Globe”, publicada em julho de 1905, sendo que os fatos inerentes ao texto estão relacionados há 95 anos (aquela época): “No Mercado Municipal de Preston ainda se pode observar uma larga pedra a qual estava antigamente afixada no ring no qual o touro era amarrado, mas o próprio anel (ring) desapareceu. “Bull ring” este é o termo que era aplicado para a designar o anel que era afixado numa pedra ou numa pesada estaca de madeira que ficava ao centro da arena. E neste anel o touro era amarrado. Em Horsham o anel de ferro no qual o touro ficava preso ainda pode ser visto no local onde eram firmadas as lutas, num pequeno anexo, ao lado de Carfax - a forma do espaço central diverge das ruas principais da cidade. Disso tem sido dito que o seu ultimo uso foi no ano de 1814. O nome de “Bull ring” como doação da cena dos Bullbaitings é ainda preservado em muitas cidades inglesas. Em Birmingham, por exemplo, a rua mais importante e movimentada chama-se “Bull Ring” – um nome de muita significância que permanece desde os tempos mais remotos, mas que descreve o local no qual muitos vestígios e sinais do antigo esporte ao longo tempo desapareceu.”  Prossegue o histórico texto, agora falando da presença dos Bulldogs nestes rings: “Na Southwark High Street, antigamente, nos tempos da dinastia Tudor, existia no local um Bull Ring, a qual desapareceu a cerca do ano 1560; a qual foi substituída pelos famosos Paris Gardens (Jardins de Paris), onde ursos foram os especiais e favoritos propósitos para lutar contra bulldogs. O Bull Ring – a arena de esportes – era circular, uma construção muito forte e fechada; e Mr. Fairbairn Ordish, em sua redação sobre “O primeiro Teatro de Londres” mostrou bem isso que a influência da “Tal estrutura redonda formato das antigas casas de esportes era “considerável” embora secundário, para o “tradicional ring” interagir na evolução dramática, em conexão com outras formas de “jogos” esta era mais apropriada e quase se aliando para o drama. Os antigos tempos do cruel esporte eram diretamente encorajados por algumas autoridades urbanas por razões que o Bullbaiting contribuía para a oferta da carne bovina. Chesterfield em Derbyshire, existia uma lei municipal que ordenava que todo açougueiro que matasse um touro no matadouro teria previamente que “iscar”, ou seja, colocar o animal para combater no Bull ring da praça do Mercado ou então pagar uma multa.” (Grifou-se).  Muito embora os Bull rings façam parte do passado e hoje o Bulldog não tenha que defender sequer o seu prato de ração, não podemos esquecer que aquela máquina de guerra ainda possui as armas com as quais antigamente defendeu territórios e divertiu os povos nos esportes sangrentos! Também não podemos esquecer que alguns contornos comportamentais outrora fundamentais ao velho gladiador, ainda hoje estão visíveis, por exemplo, no Bulldog Horácio que passa as tardes roncando estirado no tapete da sala... Quem tem um Bulldog sabe, não espere um cão servil e que faça tudo para agradar seu dono. São cabeçudos e se permitem fazer algumas vontades de seus donos sempre que lhes for conveniente ou, principalmente, se ao final o pagamento for algo comestível...  Em outras palavras, o Bulldog moderno é um cão determinado para muitas coisas e que suporta como poucos a dor física. Tais características, certamente, faziam parte dos antigos freqüentadores dos Bull baitings. Minha intenção com essa analogia é apenas contextualizar o Bulldog para que as pessoas tenham uma concepção mais completa e abrangente sobre a raça e possam com ela relacionar-se tendo em mente sua história e evolução. Nada mais que isso. Além desse aspecto histórico, que pode, em muitas casos, ser o pano de fundo de alguma reação atávica de agressividade, temos que lembrar que, muito embora sejamos atraídos principalmente pela estampa do Bulldog, o bom criador deve primar pela seleção de cães com temperamentos condizentes com a atualidade da raça e com aquilo que esperamos de um cão essencialmente de companhia. Esse é um aspecto muito importante e também muitas vezes desprezado por alguns criadores e que, vez por outra, mostra seus efeitos em filhotes com problemas comportamentais e até mesmo em cães adultos que participam de exposições da raça, muitos deles sumariamente desclassificados ao tentarem avançar sobre o árbitro. Somado a tudo isso está o despreparo dos novos proprietários para lidar com esse novo membro da família (indiscutivelmente o principal fator a desencadear problemas comportamentais), que, muito embora seja amado e tratado como um ser humano, é na verdade um animal, um cão, que precisa ser entendido e tratado como tal. E para que isso aconteça é necessário que seu dono reúna o mínimo de informações sobre ele. Mas isso é assunto para o próximo post.